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segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Hora de filosofar sobre Rousseau e Sêneca...

Rousseau, como Sêneca e os outros estóicos, guarda saudades das épocas
em que tudo se mostrava subordinado à ação da provid
ência divina e conservava sua
beleza e unidade original. Observando a imagem degradante d
os costumes, ele,
mantendo-se preso ainda à sua forma inicial de compreender a virtude, não pôde
deixar de expressar seu sentimento profundo de dor em razão de uma perda que se mostrava irreparável: “não se pode refletir sobre os costumes sem se comprazer com

a lembrança da image
m da simplicidade dos primeiros tempos. É uma bela praia,
ornada unicamente pelas mãos da natureza, para a qual incessantemente se voltam
os olhos e da qual com tristeza se sente afastar-se”.
Avançando seu pensamento, Sêneca ressalta que não há facilid
ades para se
chegar à mencionada alegria suprema. O candidato a obtê-la, seja quem for, está convidado
a trabalhar muito sob pena de se manter apenas como um ser potencialmente
virtuoso. Mesmo q
ue venha contar com o auxílio de alguém que já esteja avançado nos
planos espirituais, o indivíduo que aspira chegar a essa meta precisa se dispor a
esforçar-se incansa
velmente porque “a virtude não se conquista por procuração”.
Essa última, em síntese, diferentemente, por exemplo, do
dinheiro e dos altos cargos, advém do empenho de cada homem para superar suas
dificuldades e crescer espiritualmente, u
ltrapassando sua moleza e frouxidão.
A semente do valor supremo em questão ou mesmo o pendor inato do
homem para seguir o caminho do bem não pode, na concepção do autor genebrino,
ser considerado ainda a virtude.
A bondade natural revelada pela docilidade de caráter,
pela generosidade, e pela inocência, da mesma forma não
pode ser julgada como
seu indicativo porque tal valor supõe, além do poder de neutralizar os males, a

capacidade do homem de avançar espiritualmente, de diferenciar o certo do errado,
de agir com autonomia, de estabelecer paralelos, de definir preferências, etc.Sêneca acredita como Rousseau que todo homem possui obrigação de fazer-se

útil a seus semelhantes na sociedade. Para cumprir esse ditame, e permanecer na
via que conduz à virtude, impõ
e-se ao ser humano o dever de voltar-se sobre si
mesmo e buscar se conhecer visando ter
claro quais são seus limites e suas possibilidades.
No entender do estóico romano, um homem não é dotado para todas

as atividades, e cada um tem disposições específicas, se
gundo prescrições da
natureza. Seria uma falta, em seu julgamento, alguém seguir pelo caminho para o
qual não foi talhado, subestimando suas forças. Há, enfim, inúmeras variedades do mal, mas todas conduzem ao mesma resul
tado: o descontentamento de si mesmo. Mal-estar que tem por origem uma falta de equilíbrio da alma e das aspirações tímidas ou infelizes, que não se atrevem a tanto quanto desejam, ou que se tenta em vão realizar e pelas quais nos cansamos de esperar.
É uma inconstância, uma agitação perpétua, inevitável, que nasce dos caracteres irresolutos. Eles procuram por todos os meios atingir o objeto de seus votos: preparam-se e constrangem-se a práticas indignas e penosas. E, quando seu esforço não é recompensado, sofrem não de ter querido o mal, mas de o ter querido sem sucesso. Desde então, ei-los presos, ao mesmo tempo, do arrependimento de sua conduta passada e do temor de nela recair, e pouco a pouco se entregam à agitação estéril de uma alma que não encontra para suas dificuldades nenhuma saída, porque ela não é capaz nem de mandar nem de obedecer às suas paixões; entregam-se à aflição de uma vida que não chega a ter expansão e, enfim, a esta indiferença de uma alma paralisada no meio da ruína de seus desejos.Tudo isto se agrava quando, superada uma tão odiosa angústia, nos refugiamos no ócio e nos estudos solitários, nos quais não se saberá resignar uma alma apaixonada da vida pública, e paciente de atividade, dotada de uma necessidade natural de movimento e que não encontra em si mesma quase nenhum consolo. De sorte que, uma vez atraídos pelas distrações que as pessoas atarefadas devem mesmo às suas ocupações, não mais suportamos nossa casa, nosso isolamento e as paredes de nosso quarto; e nos vemos com amargura abandonados a nós mesmos.Daí este aborrecimento, este desgosto de si, este redemoinho de uma alma que não se fixa em nada, esta sombria impaciência que nos causa nossa própria inércia, principalmente quando coramos ao confessar as razões, e o respeito humano recalca em nós nossa angústia: estreitamente encerradas numa prisão sem saída, nossas paixões aí se asfixiam. Daí a melancolia, a languidez e as mil hesitações de uma alma indecisa, que a semi-realização de suas esperanças prolonga na ansiedade e seu malogro na desolação; daí esta disposição para amaldiçoar seu próprio repouso, para lamentar-se por não ter nada a fazer e para invejar furiosamente todos os sucessos do próximo (pois nada alimenta a inveja como a preguiça, e se desejaria ver todo o mundo malograr, porque não se soube obter êxito). "Assim cada um foge sempre de si mesmo". Mas para que fugir se não nos podemos evitar? Seguimo-nos sempre, sem nos desembaraçarmos desta intolerável companhia.Assim, convençamo-nos bem de que o mal do qual sofremos não vem dos lugares, mas de nós mesmos, que não temos força para nada suportar: trabalho, prazer, nós mesmos; qualquer coisa do mundo nos parece uma carga. Herdeiros do pensamento de Heráclito de Éfeso (séc. VI aC), os estóicos concebem a história do mundo como sendo feita por uma sucessão periódica de fases, culminando na absorção de todas as coisas pelo Logos, que é Fogo e Zeus. Completado um ciclo, começa tudo de novo: após a conflagração universal, o eterno retorno.Tudo o que existe é corpóreo e a própria razão identifica-se com algo material, o fogo. O incorpóreo reduz-se a meios inativos e impassíveis, como o espaço e o vazio; ou então àquilo que se pode pensar sobre as coisas, a idéia, mas não às próprias coisas.Nesse universo corpóreo e dirigido pelo fatalismo dos ciclos sempre idênticos, tudo existe e acontece segundo predeterminação rigorosa, porque racional. Governada pelo Logos, a natureza é por isso justa e divina e os estóicos identificam a virtude moral com o acordo profundo do homem consigo mesmo e, através disso, com a própria natureza, a qual é intrinsecamente razão. Esse acordo consigo mesmo é o que Zenão chama "prudência" e dela decorrem todas as demais virtudes, como simples aspectos ou modalidades. As paixões são consideradas pelos estóicos como desobediências à razão e podem ser explicadas como resultantes de causas externas às raízes do próprio indivíduo; seriam, como já haviam mostrado os cínicos, devidas a hábitos de pensar adquiridos pela influência do meio e da educação. É necessário ao homem desfazer-se de tudo isso e seguir a natureza, ou seja, seguir a Deus e à razão Universal, aceitando o destino e conservando a serenidade em qualquer circunstância, mesmo na dor e na adversidade.

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